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segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

CORRESPONDÊNCIA DE FRADIQUE MENDES

Querido Amigo .—Cumpro enfim a promessa feita na sua erudita ermida das Águas Férreas, naquela manhã de Março em que conversávamos ao sol sobre o carácter dos Antigos,—e remeto, como documento, a fotografia da múmia de Rameses II (que o francês banal, continuador do grego banal, teima em chamar Sesóstris), recentemente descoberta nos sarcófagos reais de Medinet-Abou pelo professor Maspero.
Caro Oliveira Martins, não acha V. picarescamente sugestivo este facto—Ramsés fotografado ?... Mas aí está justificada a mumificação dos cadáveres, feita pelos bons Egípcios com tanta fadiga e tanta despesa, para que os homens gozassem na sua forma terrena, segundo diz o Escriba, «as vantagens da Eternidade!» Rameses, como ele acreditava e lhe afirmavam os metafísicos de Tebas, ressurge efectivamente «com todos os seus ossos e a pele que era sua», neste ano da Graça de 1886. Ora 1886, para um Faraó da décima-nona dinastia, mil e quatrocentos anos anterior a Cristo, representa muito decentemente a Eternidade e a Vida Futura . E eis-nos agora, podendo contemplar as «próprias feições» do maior dos Ramesidas, tão realmente como Hokem seu Eunuco-Mor, ou Pentaour seu Cronista-Mor, ou aqueles que outrora em dias de triunfos corriam a juncar-lhe o caminho de flores, trazendo «os seus chinós de festa e a cútis envernizada com óleos de Segabai». Aí o tem V. agora diante de si, em fotografia, com as pálpebras baixas e sorrindo. E que me diz a essa face real? Que humilhantes reflexões não provoca ela sobre a irremediável degeneração do homem! Onde há aí hoje um, entre os que governam povos, que tenha essa soberana fronte de calmo e incomensurável orgulho; esse superior sorriso de omnipotente benevolência, duma inefável benevolência que cobre o Mundo; esse ar de imperturbada e indomável força; todo esse esplendor viril que a treva de um hipogeu, durante três mil anos, não conseguiu apagar? Eis aí verdadeiramente um Dono de homens ! Compare esse semblante augusto com o perfil sorno, oblíquo e bigodoso dum Napoleão III; com o focinho de buldogue acorrentado dum Bismarque; ou com o carão do Czar russo, um carão parado e afável que podia ser o do seu Copeiro-Mor. Que chateza, que fealdade tacanha destes rostos de poderosos!
Donde provém isto? De que a alma modela a face, como o sopro do antigo oleiro modelava o vaso fino:—e hoje, nas nossas civilizações, não há lugar para que uma alma se afirme e se produza na absoluta expansão da sua força. Outrora um simples homem, um feixe de músculos sobre um feixe de ossos, podia erguer-se e operar como um elemento da Natureza. Bastava ter o ilimitado querer—para dele tirar o ilimitado poder. Eis aí em Rameses um ser que tudo quer e tudo pode, e a quem Ftás, o Deus sagaz, diz com espanto: «a tua vontade dá a vida e a tua vontade dá a morte!» Ele impele a seu bel-prazer as raças para Norte, para Sul ou para Leste; ele altera e arrasa, como muros num campo, as fronteiras dos reinos; as cidades novas surgem das suas pegadas; para ele nascem todos os frutos da terra, e para ele se volta toda a esperança dos homens; o lugar para onde volve os seus olhos é bendito e prospera, e o lugar que não recebe essa luz benéfica jaz como «o terrão que o Nilo não beijou» os deuses dependem dele, e Amnon estremece inquieto quando, diante dos pilones do seu templo Rameses faz estalar as três cordas entrançadas do seu látego de guerra! Eis um homen —e que seguramente pode afirmar no seu canto triunfal: —«Tudo vergou sob a minha força: eu vou e venho com as passadas largas dum leão; o rei dos deuses está à minha direita e também à minha esquerda; quando eu falo o Céu escuta; as coisas da Terra estendem-se a meus pés, para eu as colher com mão livre; e para sempre estou erguido sobre o trono do mundo!»
«O mundo», está claro, era aquela região, pela maior parte arenosa, que vai da cordilheira Líbica à Mesopotamia: e nunca houve mais petulante ênfase do que nas Panegíricas dos Escribas. Mas o homem é, ou supõe ser, inigualavelmente grande. E esta consciência da grandeza, do incircunscrito poder vem necessariamente resplandecer na fisionomia e dar essa altiva majestade, repassada de risonha serenidade, que Rameses conserva mesmo além da vida, ressequido, mumificado, recheado de betume da Judeia.
Veja V., por outro lado, as condições que cercam hoje um poderoso do tipo Bismarque. Um desgraçado desses não está acima de nada e depende de tudo. Cada impulso da sua vontade esbarra com a resistência dum obstáculo. A sua acção, no Mundo, é um perpétuo bater de crânio contra espessuras de portas bem defendidas. Toda a sorte de convenções, de tradições, de direitos, de preceitos, de interesses, de princípios, se lhe levanta a cada instante diante dos passos, como marcos sagrados. Um artigo de jornal fá-lo estacar, hesitante. A rabulice dum legista obriga-o a encolher, precipitadamente, a garra que já ia estendendo. Dez burgueses nédios e dez professores guedelhudos, votando dentro duma sala, estatelam por terra o alto andaime dos seus planos. Alguns florins dentro dum saco, tornam-se o tormento das suas noites. É-lhe tão impossível dispor dum cidadão como dum astro. Nunca pode avançar duma arrancada, erecto e seguro tem de ser ondeante e rastejante. A vigilância ambiente impõe-lhe a necessidade vil de falar baixo e aos cantos. Em vez de «recolher as coisas da terra, com mão livre»—surripia-as às migalhas, depois de escuras intrigas. As irresistíveis correntes de ideias, de sentimentos, de interesses, trabalham por baixo dele, em torno dele: e parecendo dirigi-las, pelo muito que braceja e ronca de alto, é na realidade por elas arrastado. Assim um omnipotente, do tipo Bismarque, vai por vezes em aparência no cimo das grandes coisas;—mas como a bóia solta, vai no cimo da torrente.
Miserável omnipotência! E o sentimento desta miséria não pode deixar de influenciar a fisionomia dos nossos poderosos, dando-lhe esse feitio contrafeito, crispado, torturado, azedado e sobretudo amolgado que se nota na cara de Napoleão, do Czar, de Bismarque, de todos os que reúnem a maior soma de poder contemporâneo—o feitio amolgado duma coisa que rola aos encontrões, batendo contra muralhas.
Em conclusão:—a múmia de Rameses II (única face autêntica do homem antigo que conhecemos) prova que, tendo-se tornado impossível uma vida humana, vivida na sua máxima liberdade e na sua máxima força, sem outros limites que os do próprio querer—resultou perder-se para sempre, no tipo físico do homem, a suma e perfeita expressão da grandeza. Já não há uma face sublime: há carantonhas mesquinhas, onde a bílis cava rugas por entre os recortes do pêlo. As únicas fisionomias nobres são as das feras, genuínos Rameses no seu deserto, que nada perderam da sua força, nem da sua liberdade. O homem moderno, esse, mesmo nas alturas sociais, é um pobre Adão achatado entre as duas páginas dum código.
Se V. acha tudo isto excessivo e fantasista, atribua-o a que jantei ontem, e conversei inevitavelmente, com o seu correligionário P., conselheiro de Estado, e muchas cosas más . Más em epanhol; e más também em português no sentido de péssimas. Esta carta é a reacção violenta da conversa conselheiral e conselheirífera. Ah, meu amigo, desditoso amigo, que faz V. depois de receber o fluxo labial dum conselheiro? Eu tomo um banho por dentro—um banho lustral, imenso banho de fantasia, onde despejo, como perfume idóneo, um frasco de Shelley ou de Musset. Amigo certo et nunc et semper .—Fradique Mendes.
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sábado, 6 de dezembro de 2014

OS AMIGOS DE MÁRIO SOARES

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Texto de César Príncipe 


Em 30 de Novembro de 1983, chefiava Mário Soares o governo do Bloco Central, foi invectivado por manifestantes, em Coimbra. O governante pressionou um agente da PSP para que actuasse. Levados os detidos a Tribunal, o juiz Herculano Nogueira considerou não ter o caso acolhimento, pois o Código Penal exigia apresentação de queixa pelo ofendido. O estadista Soares não se conteve: Se o juiz entendeu que não foi um crime público, o problema é dele. Ficamos a saber que esse juiz não se importa que lhe chamem gatuno. O magistrado denunciou Sua Excelência ao Conselho Superior da Magistratura por desrespeito para com um órgão de soberania e a independência dos tribunais. Daí a dias, o Conselho de Ministros alterou o Código Penal, fazendo com que fosse dispensada qualquer queixa do ofendido, sempre que se tratasse de crimes de difamação, injúrias e outras ofensas contra órgãos de soberania e respectivos membros. Uma lei à medida.
Em 26 de Novembro de 2014, à saída da prisão de Évora, onde foi visitar o amigo José Sócrates, o ex-governante e ex-presidente da República e actual Conselheiro de Estado invectivou magistrados, inspectores da Judiciária e da Autoridade Tributária, quantos, ao longo de um ano, cooperaram nos fundamentos processuais (até ao momento, 800 páginas de provas indiciárias), que persuadiram um juiz de Instrução Criminal a ditar prisão preventiva para um ex-primeiro-ministro.
Mas ontem, Mário Soares, um ex-primeiro-ministro absolveu José Sócrates, outro ex-primeiro-ministro e condenou liminarmente a Justiça. O primeiro foi declarado inocente sem esperar pelo julgamento e a segunda considerada uma tropelia, uma vergonha, uma infâmia, uma bandalheira, coisa de uns tipos, de malandros. Pensaria Mário Soares, em 1983, que um belo dia, em 2014, poderia ser vítima da sua alteração do Código Penal?
É evidente que o ex-primeiro magistrado da Nação sempre adoptou a pele de animal feroz na defesa de determinados amigos. Não se trata de uma questão de idade ou de emoção de circunstância. Defendeu continuadamente o amigo Carlos Andrés Pérez, que foi presidente da República da Venezuela, alvo de impeachment por acção da Procuradoria-Geral da República e do Congresso Nacional, sendo destituído, em 1993, detido preventivamente e depois sentenciado a dois anos e quatro meses de prisão. Acusação confirmada: peculato doloso e apropriação indevida. No que toca à fortuna pessoal, por via política, as estimativas situavam André Pérez ao nível das centenas de milhões de dólares. Era alcunhado saudita.
Igualmente defendeu convictamente o amigo Bettino Craxi, ex-primeiro ministro de Itália, amigo de Berlusconi, apanhado na Operação Mãos Limpas.
Demitiu-se por corrupção. Não cumpriu a pena de 14 anos. Fugiu para a Tunísia, onde faleceu, amparado pelos 150 milhões de euros da conta poupança afincadamente amealhada ao leme do governo.
Neste momento, José Sócrates não é inocente: apenas beneficia de presunção de inocência. Ontem, em Évora, Mário Soares, ex-primeiro ministro e ex-presidente da República e actual conselheiro de Estado, protagonizou uma cena de degradação entre o patético e o preocupante. O patético é óbvio. O senador está a precisar de descanso no Palácio da Pena. O preocupante é que alguém o secunde, pois está convencido que o país pensa como ele. José Sócrates até poderá ter alguma razão para queixumes. Mas muito mal andará se continuar a receber visitas de nível tão elevado.
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segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

O LEITOR TEM OPINIÃO SOBRE O CASO JOSÉ SÓCRATES? NÃO TENHA

O leitor tem opinião sobre o caso José Sócrates? Não tenha. Isso configura um delito de julgamento na praça pública. A não ser que ache que José Sócrates está a ser vítima de justicialismo. Nesse caso, tem licença de porte de opinião. Para não haver dúvidas, aqui vai uma cartilha com o que é admissível pensar:
a) Avaliar a hipótese de José Sócrates ser culpado? Não se pode.
b) Levantar dúvidas sobre a idoneidade do juiz Carlos Alexandre? Pode-se.
c) Questionar as reais motivações do procurador Rosário Teixeira? Pode-se.
d) Sugerir que Joana Marques Vidal orquestrou este charivari? Pode-se.
e) Desconfiar de um propósito tenebroso do sistema judicial? Pode-se.
f) Suspeitar de manipulação obscura pela comunicação social? Pode-se.
g) Insinuar que o Passos Coelho lucra com isto? Pode-se.
h) Alvitrar que Portas é que devia ir preso por causa dos submarinos? Pode-se.
i) Considerar que Cavaco Silva tem negócios ilícitos com os seus amigos do BPN? Pode-se.
j) Conjeturar que isto é tudo uma cabala montada pelo PSD para distrair dos vistos gold? Pode-se.
Em termos de limitação à liberdade de opinião, só é proibido achar que José Sócrates pode ser culpado. Quem violar esta disposição tem de se haver com a brigada de trânsito em julgado. De resto, é tudo debatível.
Mas mesmo a defender José Sócrates há que ter cautela. Por exemplo, João Soares disse que "exceto por crime de sangue, em flagrante delito, não aceito a prisão (…) de um ex-primeiro-ministro como José Sócrates". Precipitou-se. Mesmo segurando arma pingona de sangue cravada em cadáver, nunca se aceitaria a detenção de Sócrates. A presunção de inocência manter-se-ia. Possivelmente seria legítima defesa. Ou um acidente. Ou, o mais provável, uma armadilha da suposta vítima que se lançara contra Sócrates enquanto este cortava o pão, para se empalar 17 vezes na faca e incriminar quem só desejava fazer uma sandes mista.
Entretanto, debrucemo-nos à enorme parcialidade demonstrada pela Justiça. De todos os ex-primeiros-ministros vivos, por acaso detiveram Pinto Balsemão no aeroporto por suspeitas de corrupção no caso Cova da Beira? E à chegada de que voo é que incomodaram Mário Soares a propósito da falsificação de documentos da Licenciatura em Engenharia? Ou Cavaco Silva, por alegada troca de favores no caso do TagusPark? E Guterres por beneficiar de um RERT por ele aprovado? Já para não falar de Durão Barroso, pelo Face Oculta, e Santana Lopes, pelo Freeport. Porque é que tinham de embirrar logo com este?
Num ranking de sanha persecutória, José Sócrates entra direto para o top 5 dos mais injustiçados da História. Neste momento, a tabela organiza-se assim: 5) Bruxas de Salém; 4) Capitão Dreyfus; 3) Galileu; 2) José Sócrates [nova entrada]; 1) Jesus Cristo. Apesar de uma detenção no Jardim de Getsémani ser menos maçadora do que na manga de desembarque de um voo TAP, e mesmo tendo em conta que, na verdade, Jesus estava mesmo a pedi-las, o Nazareno continua à frente porque a sua condenação injusta originou a maior religião do mundo. Mas José Sócrates ainda tem tempo.

José Diogo Quintela in "Público"
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domingo, 12 de outubro de 2014

GESTORES DA PT SÃO ESPECIALISTAS NA COMPRA DE PRÉMIOS INTERNACIONAIS

Um exemplo chocante de destruição de valor” e de uma gestão “capturada por interesses próprios e por interesses particulares de um acionista” e “submissa a interferência políticas”. “Um exemplo muito, muito mau” de uma cultura empresarial dominada por gestores com “estatuto de  inimputabilidade”, que são “especialistas na compra de prémios internacionais” e apresentados como “gurus da gestão” sem nunca terem dado provas. As palavras de António Pires de Lima sobre o que se passou na PT são duras e têm vários alvos. O ministro da Economia, que já no verão, quando se soube do investimento de €900 milhões da PT na Rioforte, tinha criticado os gestores da empresa, vai agora muito mais longe, apresentando a PT como o exemplo de más práticas que não podem ser repetidas e do que não pode ser a cultural empresarial portuguesa. Porque, explica, “separar o trigo do joio, dizer o que são as boas práticas e censurar as más, é um trabalho que também compete ao Governo”.
Nas declarações que fez ao Expresso, já depois da notícia da demissão de Zeinal da Oi, Pires de Lima nunca refere o nome do homem que dirigiu a PT desde 2008. Nem Bava nem Henrique Granadeiro são nomeados. Percebe-se que é uma opção: ao ministro da Economia interessam menos as pessoas e mais o tipo de gestão que representam e a herança que deixam.
Sobre essa herança, Pires de Lima não se alonga: “O mal está feito e agora,  destes destroços da PT, há de se fazer o que se puder, mas não há de ser igual àquilo que a PT já foi.” O governante  admite que “é improvável” que surja uma solução para a empresa ficar em mãos portuguesas, “mas também já era improvável nesta fusão com os brasileiros, como se percebeu rapidamente” (abre parêntesis: “É chocante que há uns anos se tenha questionado tanto a possibilidade de a PT ser comprada pelo grupo Sonae, que fez uma OPA valorizando a empresa €10 mil milhões, ou até ser integrada na Telefónica, para hoje vermos a PT terminar a ser alvo de empresas internacionais com projetos que não têm comparação com aqueles que se prefiguravam há uns anos”).
Resumo da história: “As perspetivas que a PT possa ter pela frente não terão comparação com as que existiam antes, mas compete aos acionistas escolherem o caminho. Eu não sou um governante socialista que vá dar palpites à PT sobre o que deve fazer,como no passado aconteceu com José Sócrates.” (Segundo parêntesis: “O momento fatal para a PT”, diz Pires de Lima, “foi o Governo de José Sócrates só ter acedido à venda da Vivo pela compra, a um preço exorbitante, da Oi, que era uma empresa de terceira classe. Esse movimento destruiu muito valor e, segundo se sabe, foi uma exigência direta de Sócrates.” E fica na mesa o primeiro de dois nomes que o governante traz à liça como corresponsáveis  pelo que aconteceu na PT. O segundo será Ricardo Salgado.)
Pires de Lima considera que o fundamental é separar o trigo do joio e enterrar os modelos de gestão tipo Bava/Granadeiro. “Para mim, o importante, porque isto não é um caso único na economia nacional, é o sentido maior de exigência que deve incidir na gestão das grandes empresas. O que eu quero é usar este mau exemplo da PT para que exemplos destes não se repitam na cultura empresarial portuguesa.”
Aprender com a lição que, segundo o governante, se conta assim: “A evolução da PT é o exemplo acabado e chocante de destruição de valor numa grande empresa nacional, que perdeu mais de 85% daquilo que era, como consequência da gestão ter sido capturada por interesses próprios e  interesses particulares de um acionista, e ter sido extraordinariamente submissa a interferências políticas completamente irracionais do ponto de vista económico.”
Para o ministro da Economia, “é importante que este modelo — que só é possível com cumplicidades políticas, com captura de interesse de acionistas por gestores — seja censurado e não seja repetido, caso contrário torna-se muito difícil atrair investimento internacional de qualidade para Portugal. Para que a economia portuguesa tenha capacidade de atrair investimento, é fundamental que os gestores sejam qualificados e funcionem em função de uma agenda alinhada com os acionistas, e não de agendas próprias. Que funcionem mais na base de produzir resultados que possam ser quantificados através das demonstrações anuais de resultados, do que tornando-
se especialistas na compra de prémios internacionais que não têm correspondência com os resultados reais da empresa.” Sim, a referência à “compra de prémios internacionais” tem um nome, e Pires de Lima nem precisa de o dizer, pois não há quem não saiba que Bava foi várias vezes escolhido como o melhor CEO europeu do sector de telecomunicações.
“Acho que vale a pena fazer a radiografia de tudo o que se passou na PT”, diz Pires de Lima. Que faz o seu raios-X: “As figuras mais altas da PT sobreviveram com uma aura de prestígio, apesar de a empresa se desvalorizar todos os anos 20% e 30%. Isto foi possível graças a muita falta de exigência, ou cumplicidade, entre núcleos de acionistas e os gestores. E também à custa de falta de exigência na comunicação social e nos agentes que acompanham estas empresas, porque não é natural que uma empresa se tenha degradado, com a mesma equipa de gestão, durante tantos anos, sem que tivessem soado sinais de alerta.” Um sintoma, diz, de “uma cultura empresarial que continuamos a ter em Portugal, na qual muitas vezes é conferido aos gestores um estatuto de quase intocabilidade. Sr. doutor para aqui, Sr. engenheiro para ali, ene mordomias, um tratamento acrítico da comunicação social. Eu vim desse mundo, eu conheço-o. E geram-se com grande facilidade em Portugal gurus da gestão que, realmente, de gerir e de criar valor em empresas nunca deram provas.”
Os analistas financeiros também não escapam. “Qualquer bom analista financeiro consegue perceber como se destruiu este valor na PT em oito anos e consegue identificar as decisões de gestão e de carácter político que tiveram interferência nesta destruição de valor, bem como estas últimas decisões inexplicáveis, em que de repente se percebeu que a comissão executiva da PT estava prisioneira, capturada, dos interesses de Ricardo Salgado”, diz o ministro da Economia.
O que pode ser feito agora? “Há modelos de governação que são privilegiados pelas empresas cotadas em bolsa, e que devem ser exaltados, há analistas financeiros que deveriam ter cumprido o seu papel, há auditores que devem fazer ouvir a sua voz de forma firme. E também não acho mal que o Governo, mais do que andar a forçar empresas a fazer o negócio A, B ou C, para depois ir inaugurar sedes e fazer disso momentos políticos, procure estabelecer padrões de governação que funcionem como censura a estes casos e aplauso aos que funcionam de outra maneira.”
No roadshow que tem feito desde há um ano para captação de investimento para Portugal, Pires de Lima diz que tem sido confrontado com muitas perguntas sobre o BES e a PT. E que essa tem sido a oportunidade para responder que “sim, esses casos não correram bem, mas temos 18 casos no nosso principal mercado de capitais que correm bem e que são geridos com boas regras de governação”.
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sábado, 11 de outubro de 2014

A GRANDE ILUSÃO

Correu o pano. António Costa ganhou o PS com uma maioria confortável e os socráticos às cavalitas. Prometeu na noite do apeamento de Seguro que há-de reconduzir o povo socialista ao poder, saudado à volta por gente de punho erguido à maneira antiga.
Com uma frase estudada, para consumo mediático, advertiu: “Este é o primeiro dia de uma nova maioria de governo. É o primeiro dia dos últimos dias deste Governo”. Depois, falou sem grandeza de alma, nem uma palavra ao adversário vencido. Ficou tudo dito sobre a unificação do PS.
Antes, num painel organizado pela RTP, perante um frouxo Nuno Morais Sarmento, viu-se José Sócrates compor a pose de comentador para dizer o contrário do que pensava: que a vitória cabia por inteiro ao mérito de Costa, sem que ele - e os históricos - tivessem contribuído para isso. Não se esqueceu, contudo, de enfatizar que votara nele.
Foi o prelúdio. Desfilariam, depois, nos vários espaços televisivos, eufóricos, alguns dos seus antigos e mais dilectos colaboradores no Governo. Desejosos de saírem da sombra.
Ao conquistar o poder partidário, António Costa trouxe Sócrates agarrado à lapela. Não adianta escamoteá-lo, como se verá em breve.
De facto, nas suas divagações pela Quadratura do Círculo, o ainda autarca de Lisboa esmerou-se na reverência contemplativa, sem nunca criticar o galopante desvario que empurrou o país para o desastre, impondo um resgate que é o cerne da austeridade.
Mas a memória é curta. Para o cidadão - activo ou pensionista - castigado pela dureza dos cortes, a culpa é do Governo que está.
Meticulosamente, José Sócrates encontrou na RTP o meio permissivo para branquear o passado. Costa precisará que ele prossiga assim, desmemoriado, para cavalgar o descontentamento até às legislativas, sem sequer exorcizar os desmandos da governação socialista.
Na encenação dos três episódios da novela, a que se prestaram as televisões nestas primárias, mais do que um conflito de personalidades, assistiu-se, em directo, à incapacidade de ambos os contendores para debaterem o presente ou pensarem o futuro do país. Nem uma palavra útil.
Entre as acusações pessoais e a esgrima de florete, somaram-se as narrativas redondas e a mais completa vacuidade. Nem uma ideia redentora.
Percebeu-se - excepto para quem engana a realidade - que nenhum deles estava preparado para ser primeiro-ministro.
Se Costa algum dia lá chegar, não tardará a desiludir, caindo do mítico altar onde o colocaram. A ficção tem o seu prazo de validade. E o peso da dívida do Estado, mesmo com a benevolência externa, imporá as suas leis a qualquer Governo.
Até lá, Passos Coelho precisa de libertar-se da Tecnoforma e de outras armadilhas que lhe lançaram aos pés e envenenaram o ambiente.
É curioso que, no espaço de uma semana - e na ressaca de uma carta anónima -, haja dito, por duas vezes, primeiro no Parlamento, depois diante do Conselho Nacional do PSD, que estará a ser vítima de pessoas “influentes”, por não ter cedido a interesses poderosos. Admitiu mesmo ter recebido um “mensageiro” que lhe prenunciou a queda próxima do seu Governo, por se ter metido com determinada pessoa…
Não fala em “campanha negra”, nem nos “pistoleiros do costume”, ao jeito de Sócrates, mas é irresistível a comparação do 'caso Tecnoforma' com o 'caso Freeport', envolvendo ambos denúncias em carta anónima.
O recurso a cartas anónimas, por natureza um acto cobarde - como é, também, o anonimato nos sites e na blogosfera - constituem uma das idiossincrasias do ser português. Os media, contudo, ora as desprezam, ora as valorizam. Depende.
A carta anónima tanto pode ser tratada como um papel apócrifo e conspirativo, como se viu no Freeport - a merecer a reprovação indignada do então bastonário Marinho Pinto -, como causar estranheza o facto de a PGR ter sido expedita a arquivar a Tecnoforma.
A traição, a denúncia e a espectacularização mediática da suspeita ganharam ultimamente um novo alento.
O certo, porém, é que , como por milagre, apagou-se nos media o 'caso BES' e o colapso do grupo Espírito Santo - com ondas de choque dramáticas que hão-de chegar mais cedo do que se pensa.
Enquanto se aguardam as conclusões das auditorias forenses pedidas pelo BdP, caiu um enorme silêncio sobre as investigações do Ministério Público.
Alguém se lembra ainda da acusação feita pelo governador, em Agosto, de que “o Grupo Espírito Santo, através das entidades não financeiras não sujeitas a supervisão do Banco de Portugal, desenvolveu um esquema de financiamento fraudulento entre as empresas do grupo”?
A tempestade financeira adivinha-se, mas, no seu retiro no Estoril, Ricardo Salgado saiu do olho do furacão. Com o PS dividido e o PSD inquieto, a grande ilusão promete continuar. O filme só está no princípio.
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Diniz de Abreu in "SOL"
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segunda-feira, 6 de outubro de 2014

PRESIDENTES ?

Em 1911, a Assembleia Constituinte da República resolveu que iria passar a ser a primeira assembleia legislativa do regime. Nada a autorizava a isso, mas ninguém se importou. Afonso Costa não tinha ainda tomado conta do partido “histórico”, que fizera o 5 de Outubro, e meia dúzia de facções andavam em guerra para eleger—no Parlamento e no Senado—o seu Presidente.
Escolheram Arriaga, um velho meio senil e pouco esperto, supondo que ele não incomodaria ninguém. Coisa em que, de resto, se enganaram. Antes de se demitir, à força claro, andou aos trambolhões de uma ilegalidade para a outra e acabou por estabelecer uma ditadura militar, depressa varrida pela Carbonária e pelos bombistas de Afonso Costa. Bernardino Machado substituiu Arriaga, com a duvidosa legitimidade dessa zaragata.
Depois de Bernardino veio Sidónio Paes (em 1917) também trazido por uma insurreição da tropa. Sidónio revogou a Constituição de 1911, inventou outra mais conveniente à sua situação e à sua política e convocou eleições directas para a Presidência da República. Ganhou por à volta de 500.000 votos, num clima que roçava o terror. Não lhe serviu de muito. Em 1918 foi morto na estação do Rossio por um admirador de Afonso Costa. Por uns tempos, durante a guerra civil de 1919, Canto e Castro, um monárquico convicto, designado pelo governo, conseguiu manter a ficção de que a República existia. Mas quando se restaurou um mínimo de ordem, e prudentemente mudada a Constituição, o Parlamento e o Senado alçaram António José de Almeida, um demagogo de feira, à Presidência para acalmar a balbúrdia e conciliar a direita. O “António José”, como lhe chamavam, assistiu à tortura e ao assassinato do seu primeiro-ministro e cumpriu o seu mandato até ao fim, uma façanha de que se gabou muito.
Para substituir esta personagem, o estado-maior do Partido Democrático (palavra de honra!) chamou Manuel Teixeira Gomes, pedófilo, diplomata e escritor, que não aguentou os sobressaltos de Lisboa e se refugiou nos costumes mais brandos da Argélia francesa. No lugar dele reapareceu o indestrutível Bernardino, de que o 28 de Maio em definitivo livrou a Pátria. Os sucessivos chefes da Ditadura não tinham nem de facto, nem de direito a menor semelhança com um presidente da República. Como a não tiveram os protegidos de Salazar (Carmona, Craveiro Lopes, Tomás). Só Eanes, Soares, Sampaio e Cavaco merecem o nome. E, a propósito, não se percebe o que sucedeu à nossa tresloucada Assembleia da República para lhe sair do crânio a ideia eminentemente imbecil de uma exposição de bustos (dizem que horríveis) dos nossos “presidentes”. Inconsciência? Ignorância? Ou simples prazer de gastar o dinheiro do Estado?
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domingo, 5 de outubro de 2014

CONVIDADOS PARA JANTAR, PROIBIDOS DE COMER 

1. Um leitor destas crónicas lamenta a minha perda de tempo com assuntos de moral familiar e, em particular, com a discutida participação dos católicos divorciados recasados na comunhão eucarística. As próprias expectativas de mudança, no próximo Sínodo dos Bispos, são o resultado da preguiça católica em pensar pela própria cabeça. Andar a pedir ordens ao clero é infantilismo cultivado. Cada católico deve ser tutor de si próprio. Eu deveria limitar-me a recordar a célebre resposta de I. Kant (de 1784) à pergunta: o que é o iluminismo?
A resposta é conhecida: “O iluminismo é a saída do homem da sua menoridade de que ele é culpado. A menoridade é a incapacidade de se servir do entendimento sem a orientação de outrem. Tal menoridade é por culpa própria, se a sua causa não reside na falta de entendimento, mas na falta de decisão e de coragem em se servir de si mesmo sem a orientação de outrem. Sapere aude [1]! Tem a coragem de te servires do teu próprio entendimento. Eis a palavra de ordem do iluminismo”.
Recordou me ainda que o Vaticano II (1962-1965) foi o começo de uma clara escuta de alguns ecos da modernidade, há muito esquecidos: a consciência como primeira instância moral (GS 16); a declaração sobre a liberdade religiosa (Dignitatis Humanae), destacando que a própria objectividade da verdade moral “não se impõe de outro modo senão pela sua própria força, que penetra nos espíritos de modo ao mesmo tempo suave e forte” (n. 1).
Inteiramente de acordo, mas vamos por partes. Kant tem razão: a recusa preguiçosa de cada pessoa se servir do próprio entendimento e andar sempre a recorrer a um “director de consciência” é um exercício de infantilismo e, por outro lado, uma atitude obscurantista de quem alimenta essa dependência. No entanto, seria igualmente infantil não alimentar o próprio entendimento com as investigações dos outros. O culto da autoignorância para ser dono das suas decisões éticas, é uma parvoíce. Somos seres de relação em todas as dimensões. Não somos apenas responsáveis diante da nossa consciência, mas também pela consciência que podemos ter do nosso mundo e do mundo dos outros.

2. Louis Dingemans (1922-2004), sociólogo e teólogo, era um dominicano belga que aprofundou, com um grupo de trabalho interdisciplinar, a situação eclesial dos divorciados recasados [2].
Para a validade de uma celebração católica do casamento sempre foi exigido o consentimento livre dos esposos e, como dizia Kierkegaard, o amor nunca é tão grande como quando se assume como um dever recíproco. A multiplicidade de uniões infelizes e divórcios, a fragilidade dos amores humanos ainda não conseguiram estancar o sonho e o desejo de muitas pessoas se aliarem para construírem uma história comum, que não esteja dependente dos humores de cada dia. Encontram-se até pessoas “pouco praticantes” que pedem para se casar pela Igreja e não é apenas pelas fotografias. Como diz L. Dingemans, parece que têm uma vaga percepção de que o casamento, sendo uma loucura, precisa do Deus do Evangelho, protector dos loucos, sentindo que todo o verdadeiro amor é de origem divina.
Muito ou pouco praticantes, por culpa ou sem culpa de um ou de ambos, o facto é que existem rupturas sem remédio. Surgem, depois, novas uniões. Pondo de lado a leviandade e os caprichos de muitos casos, também existem divorciados recasados que nesses processos complicados aprofundaram e redescobriram a sua fé, que desejam alimentar.
Como já vimos em artigos anteriores, não são católicos excomungados. Pelo contrário, são convidados a participar na vida da Igreja e a frequentarem a Eucaristia. Mas são proibidos de comungar: convidados para uma refeição e impedidos de comer. À primeira não se entende esta incongruência e à segunda, ainda menos. Invoca-se um estado permanente de violação da aliança matrimonial. Razão apresentada: existe uma contradição objectiva de ordem simbólica, pois a aliança entre Deus e a Humanidade, entre Cristo e a sua Igreja é actualizada pelo laço entre marido e mulher. O autor citado mostra, de forma analítica, que este é um argumento falacioso. Deus é sempre fiel, mas os seres humanos não são Deus. Podem falhar e a misericórdia de Deus nunca falha.

3. É bom não esquecer uma oração da missa do domingo passado: Senhor, que dais a maior prova do vosso poder quando perdoais e vos compadeceis, derramai sobre nós a vossa graça.
O Papa Francisco, que tem muita graça em receber a graça de Deus, resolveu, na audiência geral do passado dia 10, propor que a Igreja, em todas as suas expressões, seja uma escola da misericórdia. Não estávamos habituados. Era mais associada a um ministério com tribunais
lentos e sem piedade.

[1] Atreve-te a pensar
[2] Cf. dossier Chrétians qui sont dévorcés et remariés, Centre Dominicain de Froismont, Bélgica ; Louis Dingemans, Mariage et alliance. L’ambiguïté d’un symbole, Rev. Lumière et Vie, n 206 (1992), pg 25-38 ; Jesus face au divorce,

Racine|Fidélité, 2004
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sexta-feira, 3 de outubro de 2014

CARTA DO VASCO

Cara Sra. Procuradora Geral da República

Depois de ler a entrevista de Fernando Madeira, ex-dono da Tecnoforma, à revista Sábado, venho por este meio denunciar alguns dados que serão certamente relevantes para as investigações que o Ministério Público está a fazer, nomeadamente sobre a ligação de Pedro Passos Coelho à Tecnoforma entre 1997 e 2001.
Na altura, o sr. Passos Coelho foi efetivamente pago para presidir ao Centro Português para a Cooperação, a ONG criada pela Tecnoforma para conseguir projectos de formação profissional financiados por entidades públicas como a Comissão Europeia. Todos os meses, durante cerca de 3 anos, o Sr. Passos Coelho, que era deputado em exclusividade do PSD em exclusividade de funções, recebeu mensalmente mil contos (cerca de 5 mil euros) através de pagamentos em cheque e sobretudo de transferências bancárias.
O pagamento foi acertado entre ele e o Sr. Fernando Madeira, com a intermediação do advogado João Luís Gonçalves, ex-Secretário Geral da JSD (quando Passos Coelho era o líder dos jotinhas) e também um dos directores do CPP presidido por Passos Coelho. O advogado João Luís também era pago mensalmente com 500 contos (2500 euros) para fazer parte do Centro Português de Cooperação.
Os pagamentos mensais ao sr. Passos Coelho foram concretizados através das contas bancárias da empresa Tecnoforma e da empresa Liana (que pertencia ao então grupo Tecnoforma), cujas contas bancárias estavam sedeadas nos bancos Totta & Açores (hoje banco Totta Santander), BCI (Banco de Comércio e Indústria) e BCP, para a conta conjunta d Passos Coelho que estava aberto no banco Totta & Açores (Totta Santander), na dependência de Almada, na A. D. Nuno Álvares Pereira nº 80 (Pragal), onde ainda hoje se encontra.
No total, o sr. Passos Coelho recebeu dezenas de milhares de euros sem que tivesse alguma vez descontado ou declarado o que quer que seja às Finanças. O dinheiro saiu sempre da Tecnoforma / Liana, mas desconheço como é que isso foi justificado internamente nas contas das empresas.
Julgo, no entanto, que será fácil ao Ministério Público conseguir esses dados através da identificação das respectivas movimentações financeiras das referidas contas bancárias e do cruzamento desses dados com os relatórios e contas da Tecnoforma e do próprio Centro Português para a Cooperação.
A contabilidade da Tecnoforma e do Centro Português para a Cooperação estava a cargo do contabilista Dr. José Duro.
Sem mais espero que se faça justiça para o bem da nossa sociedade.

Vasco
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quinta-feira, 11 de setembro de 2014

VAI À MERDA, JOÃO !

Meu Caro João,

Ouvi-te brevemente nos noticiários da TSF no fim-de-semana e não acreditei no que estava a ouvir.
Confesso que pensei que fossem “excertos”, fora de contexto, de alguém a tentar destruir o (pouco) prestígio de Economista (que ainda te resta).
Mas depois tive a enorme surpresa: fui ler, no Diário de Notícias a tua entrevista (ou deverei dizer: o arrazoado de DISPARATES que resolveste vomitar para os microfones de quem teve a suprema paciência de te ouvir). E, afinal, disseste mesmo aquilo que disseste, CONVICTO e em contexto.
Tu não fazes a menor ideia do que é a vida fora da redoma protegida em que vives:
- Não sabes o que é ser pobre;
- Não sabes o que é ter fome;
- Não sabes o que é ter a certeza de não ter um futuro.
Pior que isso, João, não sabes, NEM QUERES SABER!
Limitas-te a vomitar ódio sobre TODOS aqueles que não pertencem ao teu meio. Sobes aquele teu tom de voz nasalado (aqui para nós que ninguém nos ouve: um bocado amaricado) para despejares a tua IGNORÂNCIA arvorada em ciência.
Que de Economia NADA sabes, isso já tinha sido provado ao longo dos MUITOS anos em que foste assessor do teu amigo Aníbal e o ajudaste a tomar as BRILHANTES decisões de DESTRUÍR o Aparelho Produtivo Nacional (Indústria, Agricultura e Pescas).
És tu (com ele) um dos PRINCIPAIS RESPONSÁVEIS de sermos um País SEM FUTURO.
De Economia NADA sabes e, pelos vistos, da VIDA REAL, sabes ainda MENOS!
João, disseste coisas absolutamente INCRÍVEIS, como por exemplo: “A MAIOR PARTE dos Pensionistas estão a fingir que são Pobres!”
Estarás tu bom da cabeça, João?
Mais de 85% das Pensões pagas em Portugal são INFERIORES a 500 Euros por mês (bem sei que algumas delas são cumulativas – pessoas que recebem mais que uma “pensão” - , mas também sei que, mesmo assim, 65% dos Pensionistas recebe MENOS de 500 Euros por mês).
Pior, João, TU TAMBÉM sabes. E, mesmo assim, tens a LATA de dizer que a MAIORIA está a FINGIR que é Pobre?
Estarás tu bom da cabeça, João?

João, disseste mais coisas absolutamente INCRÍVEIS, como por exemplo: “Subir o salário mínimo é ESTRAGAR a vida aos Pobres!”
Estarás tu bom da cabeça, João?
Na tua opinião, “obrigar os empregadores a pagar um salário maior” (as palavras são exactamente as tuas) estraga a vida aos desempregados não qualificados. O teu raciocínio: se o empregador tiver de pagar 500 euros por mês em vez de 485, prefere contratar um Licenciado (quiçá um Mestre ou um Doutor) do que um iletrado. Isto é um ABSURDO tão grande que nem é possível comentar!
Estarás tu bom da cabeça, João?
João, disseste outras coisas absolutamente INCRÍVEIS, como por exemplo: “Ainda não se pediram sacrifícios aos Portugueses!”
Estarás tu bom da cabeça, João?
Ainda não se pediram sacrifícios?!?
Em que País vives tu, João?
Um milhão de desempregados;
Mais de 10 mil a partirem TODOS os meses para o Estrangeiro;
Empresas a falirem TODOS os dias;
Casas entregues aos Bancos TODOS os dias;
Famílias a racionarem a comida, os cuidados de saúde, as despesas escolares e, mesmo assim, a ACUMULAREM dívidas a TODA a espécie de Fornecedores.
Em que País vives tu, João?
Estarás tu bom da cabeça, João?
Mas, João, a meio da famosa entrevista, deixaste cair a máscara: “Vamos ter de REDUZIR Salários!”
Pronto! Assim dá para perceber. Foi só para isso que lá foste despejar os DISPARATES todos que despejaste.
Tinhas de TRANSMITIR O RECADO daqueles que TE PAGAM: “há que reduzir os salários!”.
Afinal estás bom da cabeça, João.
Disseste TUDO aquilo perfeitamente pensado. Cumpriste aquilo para que te pagam os teus amigos da Opus Dei (a que pertences), dos Bancos (que assessoras), das Grandes Corporações (que te pagam Consultorias).
Foste lá para transmitir o recado: “há que reduzir salários!”.
Assim já se percebe a figura de mentecapto a que te prestaste.
E, assim, já mereces uma resposta:
- Vai à MERDA, João!

Um Abraço,

Carlos Paz
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domingo, 3 de agosto de 2014

ROUBAS UM PÃO ÉS UM LADRÃO

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ACTIVOS DA FAMÍLIA ESPIRITO SANTO

HERDADE DA COMPORTA (onde, candidamente, iam brincar aos pobrezinhos)

Com uma área de 12,5 mil hectares (área cultivada de arroz de 1.100 hectares e produzindo também vinho, milho, batata-doce e curgetes). A parte florestal tem área de 7.100 hectares de pinheiros e carvalhos. Existe um projecto imobiliário e turístico.

INDUSTRIA HOTELEIRA

Possui 14 unidades hoteleiras (Tivoli, Hotels & Resorts), todos de 4 e 5 estrelas. No Brasil 2 unidades ( S.Paulo e Praia do Forte em S. Salvador da Baía). Em Portugal 12 unidades (6 no Algarve, 3 em Lisboa, 2 em Sintra e um em Coimbra). Tem uma oferta total de 3000 quartos.

OPERADOR TURÍSTICO

Tem mais de 50 balcões espalhados pelo País. A actividade alarga-se até Angola, Itália e Espanha. Opera com as marcas Top Atlântico, Carlson Wagonlit e BCD Travel. Detém a operadora online Netviagens.

PORTUCALE

Proprietários da herdade Vargem Fresca (Ribatejo) com cerca de 510 hectares, alberga dois campos de golfe, Ribagolfe I e II. A Portucale esteve envolvida num escândalo em conjunto com o governo Santana Lopes/Durão Barroso/Paulo Portas, acerca do abate ilegal de sobreiros, autorizado à pressa e após terem perdido as eleições para o PS. Conta-se, que na altura o CDS teria recebido um milhão de euros e justificado ter sido oferecido por diversos donativos de militantes, entre eles, o muito glosado MANUEL LEITE DO REGO, propriedade destacada da Companhia das lezírias (do Estado) com o argumento/justificação de que iriam ali plantar novas espécies arbóreas. Era bom e conveniente que alguém fizesse uma investigação sobre a forma como esta propriedade foi transacionada. Como foi retirada do Estado e a que preço.
                  
ESPIRITO SANTO SAÚDE

O grupo tem cerca de 18 unidades clínicas, 1.200 camas e cerca de 9.000 funcionários. Os três principais hospitais são o da Luz, em Lisboa, o da Arrábida, em Vila Nova de Gaia e o Beatriz Ângelo, em Loures.

FAZENDAS NO BRASIL

O Grupo Espírito Santo tem duas grandes fazendas no interior do Brasil. Uma no Estado de S. Paulo com 12 mil hectares, mais propriamente em Botucatu, chamada Fazenda Morrinhos. Produz, laranjas, limões, eucalipto e cana de açúcar.
A outra, é a Fazenda Pantanal de Cima, no estado de Tocatins, com uma área de 20.000 hectares, 3 mil dos quais asseguram produção de arroz no verão e de soja no inverno.

HERDADE NO PARAGUAI

É a maior herdade do Grupo, Estende-se por cerca de 135 mil hectares, no Paraguai. Este terreno  tem uma dimensão equivalente à do quinto maior concelho do País (Uma área onde caberiam 16 Lisboas), Alberga mais de 53 mil cabeças de gado e possui 75 mil hectares de pastagens, 12 mil hectares de floresta e 5 mil de cultivo agrícola,  nomeadamente de soja e algodão.

ATLANTIC MEALS - AGROALIMETAR

Produz arroz, milho e alimento para crianças, como as farinhas sem glúten. Tem três unidades industriais em Portugal (Coruche, Biscainho e Alcácer do Sal) e uma outra em Sevilha. Opera com as marcas Ceifeira, Sorraia, Atlantic e Atlantic Le Chef. A Atlantic Meals é fornecedora das indústrias cervejeira e agroalimentar. Tem uma capacidade de secagem de  arroz e milho de 50 mil ton. ano.

ESPIRITO SANTO PROPERTY BRASIL

É a empresa imobiliária do grupo no Brasil associada à OA (Oscar Americano), com vários projectos residenciais, de comércio, parques logísticos, escritórios e loteamento. As actividades principais são em S. Paulo, onde desenvolve projectos imobiliários emblemáticos, como o complexo Villa Lobos, com área comercial e residencial, ou a Alameda dos Pinheiros. Tem expandido a actividade a outros estados brasileiros, como é o caso da Santa Catarina, Paraná, Rio de Janeiro e Baía. Já concretizou empreendimentos fora do Brasil, como é o caso do edifício Plaza Miami, no centro desta cidade norte americana, um prédio com uma área total de 120 mil metros quadrados com área residencial, escritórios e hotel.

ESPIRITO SANTO PROPERTY (Portugal)

É um dos maiores promotores imobiliários de Portugal. Vocacionado para o segmento alto, a empresa foi criada com o nome Espart, designação que acabou por ser alterada em Novembro do ano transacto. Um dos primeiros grandes trabalhos foi o desenvolvimento da Quinta do Patiño, no Estoril (onde está o Dias Loureiro e o Rendeiro), transformando um antigo palácio e respectivos jardins numa das áreas mais exclusivas de Portugal. Conta além disso, no seu portfólio, com edifícios em Lisboa, com o nº. 15 da Rua Castilho e o 238 da Avª. da Liberdade, o Ivens 31, no Chiado, e o Parque dos Príncipes, em Telheiras. E tem as residências do Palácio Estoril, a Quinta do Peru, em Azeitão, as Casas de São Francisco, em Santiago de Cacém, o Oeiras Golf & Residence, o Doro Atlantic Garden, em Gaia e as Quintas D'Al-Gariya, em Portimão, entre outros edifícios.

COMPANHIA DE SEGUROS TRANQUILIDADE

Valor de activos sob gestão 800 (oitocentos) milhões de Euros.

BANCO ESPIRITO SANTO (A GALINHA DOS OVOS DE OURO)


Não consta neste rol, as "poupanças estratégicas" eventualmente acantonadas em offshores (do BES/Angola, não se sabe onde param, cerca  5,7 mil milhões de $USA).
Sabe-se é que:
O BES/Portugal emprestou 3 milhões de Euros ao BES/Angola, os quais, dizem, estão perdidos.
O BES/Portugal emprestou ao Grupo Espirito Santo 1.200 milhões de €. Com insolvência deste grupo, a liquidação desta verba é um sonho.
A Caixa Geral de Depósitos desembolsou 300 milhões de euros, recebendo como garantia as acções do Grupo que, nesta altura do campeonato, valem um grandíssimo ZERO. A CGD (empresa pública) empresta 300 milhões de euros? E quem será responsável? Logicamente, a Ministra das Finanças. Estão todos calados como ratos...
No cômputo geral,  a exposição de empresas portuguesas no Espírito Santos Financial Group (maior accionista do BES), é de cerca 5.000 milhões de € (cinco mil milhões de euros).
Ao  ser aceite o pedido de protecção de credores e/ou em alternativa ser declarada a insolvência deste grupo, lá vem mais  um "tsunami" financeiro (Quando o mar bate na rocha quem se lixa, quem é?, quem é?: Obviamente o mexilhão).
No meu mail de cinco do corrente, aconselhava a quem tivesse muita fé, a pôr uma velinha aos pés da N. S. de Fátima e que rezassem muito e com toda a veemência, a fim de não ser outra vez o "mexilhão" a pagar estes desmandos. Hoje, não peço que ponham uma velinha mas sim uma palete delas e não rezem, acampem na igreja e se possível,  peçam acompanhamento pelo Duarte Lima. 
A desgraça deste país é o sistema bancário e tudo o que rodeia. Não foi esta oligarquia, com o conforto do sr. governador do Banco de Portugal e do residente de Belém os incentivadores da chamada do FMI? Com que objectivo? O objectivo era a salvação das suas casas bancárias, as maiores causadores da dívida soberana. É hoje sobejamente sabido, ser ela mais privada do que pública em detrimento do povo português, vilmente sacrificado, para satisfação da ambição destes malandros.
Enoja, ver, ler e ouvir os mais diversos gurus do regime, tentar minimizar  os desmandos desta "troupe". No entanto, o excremento é tanto, que a carpete da "sopeira",  já não tem capacidade para acolher tanto lixo e este, já incontrolavelmente, é exposto à saciedade.
Onde estarão as críticas do Marcelo Rebelo de Sousa (cardeal Richelieu) e de Sousa Tavares? O primeiro tem como companheira, há longuíssimos anos,  Rita Berta Cabral, administradora não executiva do BES e um dos três membros da Comissão de Vencimentos do BES, entre 2008/2012. Assíduo acompanhante de Ricardo Salgado nas férias no Mediterrâneo. Os netos do segundo (Sousa Tavares), são os mesmos netos do sr. Ricardo Salgado.
Em súmula, que tem o sr. Cavaco Silva e o Governo a comentar sobre estas turbulências? Terão moral suficiente para tomar decisões adequadas e criticar o seu aliado mais forte no derrube do governo anterior? Já começa a ser trágico (para o povo português) o constante envolvimento destas entidades com esta pirataria bancária. E o que constrange mais, desde o mais brilhante quadro até ao mais humilde servente? O saber-se que esta gente vai usufruir de chorudas pensões de reforma e passam incólumes perante esta (in)justiça portuguesa.
Por fim, descobriu-se um novo super-homem, Vítor Bento. Este sr. foi convidado para presidir à administração do BES (antes tinha sido convidado para ministro das finanças. Declinou (sempre é melhor banqueiro que ministro) e assim avançou outro super-homem Vítor Gaspar (...afinal  havia outro..."vítoraf" ... como diz uma famosa canção), o que me leva a acreditar que o Vítor (Gaspar), não era tão super como os "gurus do regime" nos quiseram vender; e este (Bento) será?
Desconfio, e muito. Para já, o sr. Vítor Bento (protegido do Catroga) não tem qualquer experiência bancária. Teremos de acreditar na sua perspicácia e inteligência e apesar de lhe conceder o benefício da dúvida nestes requisitos, não acredito nele. E porquê? Quando este individuo afirma e reafirma que a actual situação económica/financeira tem por culpado primário o POVO PORTUGUÊS, por ter VIVIDO ACIMA DAS SUAS POSSIBILIDADES, vai agora presidir a uma entidade, testemunho vivo, contrário à sua  pseudo-teoria.
Por fim, constata-se o aumento da dívida em 40%, desde a chegada da Troika. A intervenção do Estado em 3 bancos (BCP, BANIF e BPI) BPN E BPP são casos de polícia e agora o estrondo do BES a somar às chorudas reformas dos ex-presidentes banqueiros, autores, no mínimo, de gestão danosa, com direito a prisão. E os "gurus do regime" não comentam nada? Ou será que comem todos na mesma gamela doirada?
O povo no alto da sua sabedoria: "ROUBAS UM PÃO ÉS UM LADRÃO, ROUBAS UM MILHÃO ÉS UM BARÃO"


Grupo Espírito Santo: "too big to fail" ou "too holy to jail?"
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terça-feira, 15 de julho de 2014

A HISTÓRIA DO BANCO DO MEU AVÔ

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Vamos IMAGINAR coisas…

Vamos imaginar que o meu avô tinha criado um Banco num País retrógrado, a viver debaixo de um regime ditatorial.
Depois, ocorreu uma revolução.
Foi nomeado um Primeiro-Ministro que, apesar de ser comunista, era filho do dono de uma casa de câmbios. Por esta razão, o dito Primeiro-Ministro demorou muito tempo a decidir a nacionalização da Banca (e, como tal, do Banco do meu avô).
Durante esse período, que mediou entre a revolução e a nacionalização, a minha família, tal como outras semelhantes, conseguiu retirar uma grande fortuna para a América do Sul (e saímos todos livremente do País, apesar do envolvimento direto no regime ditatorial).

Continuemos a IMAGINAR coisas…

Após um período de normal conturbação revolucionária, o País entrou num regime democrático estável. Para acalmar os instintos revolucionários do povo, os políticos, em vez de tentarem explicar a realidade às pessoas, preferiram ser eleitoralistas e “torrar dinheiro”.
Assim, endividaram o País até entrar em bancarrota, por duas vezes (na década de 80).
Nessa altura, perante uma enorme dívida pública, os políticos resolveram privatizar uma parte significativa do património que tinha sido nacionalizado.
Entre este, estava o Banco do meu avô.

E, continuando a IMAGINAR coisas…

A minha família tinha investido o dinheiro que tinha tirado de Portugal em propriedades na América do Sul. Como não acreditávamos nada em Portugal, nenhum de nós quis vender qualquer das propriedades ou empatar qualquer das poupanças da família. Mas, queríamos recomprar o Banco do meu avô.
Então, viemos a Portugal e prometemos aos políticos que estavam no poder e na oposição, que os iríamos recompensar (dinheiro, ofertas, empregos, etc…) por muitos anos, se eles nos vendessem o Banco do meu avô muito barato.
Assim, conseguimos que eles fizessem um preço de (vamos imaginar uma quantia fácil para fazer contas) 100 milhões, para um Banco que valia 150.
Como não queríamos empatar o “nosso” dinheiro, pedimos (vamos imaginar uma quantia) 100 milhões emprestados aos nossos amigos franceses que já tinham ganho muito dinheiro com o meu avô. Com os 100 milhões emprestados comprámos o Banco (o nosso dinheiro, que tínhamos retirado de Portugal, esse ficou sempre guardado).
E assim ficámos donos do Banco do meu avô. Mas tínhamos uma dívida enorme: os tais 100 milhões. Como os franceses sabiam que o Banco valia 150, compraram 25% do Banco por 30 milhões (que valiam 37,5 milhões) e nós ficámos só a dever 70 milhões (100-30=70). Mesmo assim era uma enorme dívida.

Continuemos a IMAGINAR coisas…

Tal como combinado, viemos para Portugal e começámos a cumprir o que tínhamos prometido aos políticos (dinheiro para as campanhas eleitorais, ofertas de vária espécie, convites para todo o tipo de eventos, empregos para os familiares e para os próprios nos momentos em que estavam na oposição, etc…).
Como ainda tínhamos uma grande dívida, resolvemos fazer crescer mais o Banco do meu avô. 
Assim, fomos falar com uma nova geração de políticos e prometemos todo o tipo de apoios (dinheiro, ofertas, empregos, etc…) se nos dessem os grandes negócios do Estado.
E eles assim fizeram. E o Banco do meu avô, que tinha sido vendido por 100, quando valia 150, valia agora 200 (por passarem por ele os grandes negócios do Estado).
Mas, mesmo assim, nós ainda devíamos 70 milhões (e tínhamos de pagar, pelo menos uma parte dessa dívida, caso contrário, os franceses ficavam com o Banco do meu avô).

E, continuando a IMAGINAR coisas…

O meu tio, que era presidente do Banco do meu avô, reformou-se. Nessa altura a família estava preparada para nomear um dos meus primos para presidente. Eu queria ser presidente e prometi à família toda um futuro perpétuo de prosperidade se me nomeassem a mim como presidente.
E assim foi. Fui, finalmente, nomeado presidente do Banco do meu avô.
Mas era preciso pagar uma parte da dívida aos franceses. Podíamos vender uma parte do Banco em Bolsa, mas deixávamos de mandar (logo agora que eu era presidente – não podia ser assim).

Então desenhei um plano:
Criei uma empresa, chamada “Grupo do meu avô” (em que a minha família tinha 100% do capital) e passei os nossos 75% do Banco (25% eram dos franceses) para essa nova empresa.
Assim, a família era dona de 100% do “Grupo” que era dono de 75% do Banco.
Falei com os franceses e combinei mudarmos os estatutos do Banco: quem tivesse 25% mandava no Banco (e os franceses não se metiam, a não ser para decidir os dividendos que queriam receber).
Assim, como o Banco agora valia 200, vendemos 50% na Bolsa por 100 (metade dos 200). Com 50 capitalizámos o Banco. Os restantes 50 tirámos para nós (37,5 para a família e 12,5 para os franceses).
Demos também os nossos 37,5 aos franceses e assim ficámos só a dever 32,5 milhões (70-37,5). Ainda era uma grande dívida, mas continuávamos a mandar no Banco do meu avô (apesar da nossa empresa “Grupo do meu avô” só ser dona de 25% - os franceses tinham outros 25% e os restantes 50% estavam dispersos por muitos acionistas).
Ainda tínhamos uma enorme dívida de 32,5 milhões. Mas, a verdade é que continuávamos a mandar no Banco do meu avô e tínhamos transformado uma dívida inicial de 100 em outra de 32,5 (sem termos gasto um tostão da família – o nosso dinheiro continua, ainda hoje, guardado na América do Sul). Convenci-me, nessa altura, que era um génio da finança!

Continuemos a IMAGINAR coisas…

A certa altura, o crédito tornou-se uma coisa muito barata. Eu sabia que tínhamos um limite original de 100 milhões e já só devíamos 32,5 milhões. Assim, a empresa “Grupo do meu avô” voltou a endividar-se: pediu mais 67,5 milhões (voltámos a dever 100 milhões) e desatei a comprar tudo o que fosse possível comprar.
Tornei-me assim, o dono disto tudo (o Banco do meu avô, a Seguradora do meu avô, a Meu avô saúde, a Meu avô hotéis, a Meu avô viagens, a Construtora do meu avô, a Herdade do meu avô onde se brinca aos pobrezinhos, etc…).
Entretanto fui pagando as minhas promessas aos políticos (dinheiro para as campanhas eleitorais, ofertas de vária espécie, convites para todo o tipo de eventos, empregos para os momentos em que estavam na oposição, etc…).

E, continuando a IMAGINAR coisas…

Mas havia agora uma nova geração de políticos. Fui falar com eles e garanti que os apoiaria para o resto da vida (dinheiro, ofertas, empregos, etc…) se eles continuassem a fazer passar os grandes negócios do Estado pelo Banco do meu avô.
Mas, tive azar: houve uma crise financeira internacional.
Deixou de haver crédito. Os juros subiram. Os credores queriam que o Grupo do meu avô pagasse a dívida.
E, além disso tudo, deixou de haver os grandes negócios do Estado.
Mas eu, que me achava um génio da finança e que já estava habituado a ser o dono disto tudo, não queria perder a minha posição de presidente do Banco do meu avô.
Tinha de arranjar uma solução. Fui à procura, e encontrei em África, quem tinha dinheiro sujo e não se importava de investir e deixar-me continuar a mandar e a ser dono disto tudo.

Continuemos a IMAGINAR coisas…

Resolvi então criar uma nova empresa: a “Rio do meu Avô” que passou a ser dona de 100% do capital da “Grupo do meu avô”, que era dona de 25% do “Banco do meu avô”. E eu que era dono disto tudo passei a ser o presidente disto tudo.
Fiz uns estatutos para o “Grupo do meu avô” que diziam que quem tivesse 25% mandava na empresa. Vendi 20% aos Angolanos e 55% na Bolsa. A “Rio do meu avô” ficou assim dona de 25% do “Grupo do meu avô” (mas mandava como se tivesse 100%). A “Grupo do meu avô”, dona de 25% do “Banco do meu avô” (mandava como se tivesse 100%).
Assim, a minha família já só tinha 5% (25% de 25%) do “Banco do meu avô” (mas eu continuava a mandar como se tivéssemos 100%). Já não havia dúvidas: eu era mesmo um génio da finança.

Com os 75 milhões da venda do “Grupo do meu avô” (aos Angolanos e na Bolsa), paguei uma parte da dívida. Mas, na verdade, ainda tínhamos uma dívida de 25 milhões (e continuávamos a não querer mexer no nosso dinheiro – esse continua bem guardado na América do Sul). 

E, continuando a IMAGINAR coisas…

Mas as coisas continuaram a correr mal. Se calhar eu não sou assim tão grande génio da finança. Todos os nossos negócios dão prejuízo (até mesmo o Banco do meu avô). Raio de azar. Ainda por cima, a crise não acaba. 

Fiz então o meu último golpe de génio. Convenci todos os bons clientes a comprarem ações do Banco do meu avô, para aumentar o capital sem ter de endividar mais a “Rio do meu avô” (e sem ter de tocar no dinheirinho da família, que continua bem guardado na América do Sul).

Mas os franceses queriam o dinheiro deles. Então, como presidente do Banco do meu avô, emprestei dinheiro deste ao Grupo do meu avô e à Rio do meu avô. Assim pagámos aos franceses. Mas ficámos com um problema: o Banco do meu avô está completamente arruinado.

Tinha de arranjar uma solução!

Fui falar com os novos políticos com uma proposta: reformo-me, dou lugares de Administração a uma série de políticos do partido do Governo e eles que resolvam o problema do Banco do meu avô.

Continuemos a IMAGINAR coisas…

Os políticos aceitaram a minha proposta (aceitam sempre que se fala de lugares de Administração).
Finalmente reformei-me. Ainda somos donos de 5% do Banco do meu avô e de uma série de outros negócios (sustentados pelas dívidas ao Banco do meu avô).
Tudo isto sem termos gasto um tostão (o dinheiro da família continua todo guardado na América do Sul).

E, tomei a última medida antes de me reformar: atribuí a mim próprio uma reforma de um milhão de euros por ano (para as despesas correntes).

E, assim, acabou a história IMAGINADA do Banco do meu avô.

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CARLOS PAZ
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